Descrição

Nascida em um ano do Dragão de Água, segundo o calendário chinês, Maria-Mercè Marçal se aproximou desta imagem por sua abertura à mística, e principalmente pelo impacto que lhe causava a história do dragão morto por São Jorge. Ela era uma escritora feminista catalã que afirmava sua poesia como uma língua abolida, e a figura do dragão silenciado pela tradição patriarcal é uma das narrativas de que se apropriou subversivamente para falar em nome de outras línguas, rebeldes, monstruosas: as das mulheres, da luta de classes, da língua catalã e a do desejo lésbico. Reunimos nesta publicação dois ensaios nos quais Maria-Mercè Marçal recupera a potência mítica do dragão em sua relação com a literatura, e escreve sobre os símbolos de sua obra poética inscrita sob o signo do dragão.

“Todo processo civilizatório exclui e limita o seu domínio sobre a natureza, e sobre as mais diversas facetas da experiência, o seu controle sobre os impulsos primários de vida e de morte comporta o exílio para além da consciência e da linguagem daquilo que é negado, e implica, portanto, sofrimento soterrado, paixão. E tudo aquilo que fica de fora, irredutivelmente outro e desconhecido, é associado com as forças do mal. O dragão é o poder terrível daquilo que em nós fica do que foi excluído. O escritor, a escritora, encara, frequentemente de forma enviesada e oblíqua, as palavras e, às vezes, consegue que o monstro fale, diga bocados da sua verdade obscura, forçando e ampliando assim os limites daquilo que pode ser dito. Porque sempre o terrível está ao lado do belo, como o seu limite e simultaneamente como a sua condição de existência.”

Este projeto foi realizado com recursos da Lei Municipal de Incentivo à Cultura de Belo Horizonte. Projeto 0182/2021.