n.129 | 2021 – Sair da escuridão

Georges Didi-Huberman

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Descrição

Neste breve e epistolar ensaio destinado ao diretor László Nemes, Georges Didi-Huberman escreve uma resposta teórica e crítica ao filme O filho de Saul.  Pelo olhar de Saul, que busca incessantemente um local para inumar uma criança morta nas redondezas de um campo de extermínio, sair da escuridão é reconhecer uma genealogia, ainda que imaginária, e, no meio das trevas, lançar uma luz dentro do abismo. Na tarefa de Didi-Huberman, o trabalho teórico do pensamento dialoga profundamente com o olhar morfológico das imagens, ofertando vislumbres históricos e arquivísticos que a narrativa cinematográfica faz emergir tão singularmente.

“Ainda não disse nada, caro László Nemes, acerca do argumento principal sobre o qual se desenvolve sua história. O filho de Saul conta a história de um homem que quer, de algum modo, salvar uma criança, mas se trata de uma criança já morta. Todo seu ser se revolta quando ele escuta o médico dos SS, diante do cadáver, pronunciar a ordem: ‘Abra-a’. Sair da escuridão seria então, para Saul, tentar, custe o que custar, evitar o despedaçamento anatômico da criança, poupá-la do antro atroz do forno crematório e da dispersão anônima das cinzas pelo Vístula. Sair da escuridão significaria aqui resistir à inexistência do morto: daí a exigência, para que o morto exista, de um ritual, de uma oração adequada, de um rabino e, sobretudo, de uma inumação digna. Tirar a criança morta da escuridão: tal é o paradoxo, já que tudo isso será tentado para dar-lhe uma terra para descansar. Mas não haverá nem terra onde descansar, nem kaddish, nem rabino por fim. Nem sequer saberemos como se chama a criança.”

Este projeto foi realizado com recursos da Lei Municipal de Incentivo à Cultura de Belo Horizonte. Projeto 1094/2020.

Edição
Maria Carolina Fenati

Tradução
Ricardo Lessa Filho
Ângela Cristina Salgueiro Marques

Revisão
Andrea Stahel

Projeto gráfico
Luísa Rabello

Coordenação da coleção
Luísa Rabello
Maria Carolina Fenati

Julho de 2021