n.82 | 2018 – Gestão de crianças: a democracia bem educada

Henrique Estrada Rodrigues

Baixar

Descrição

Este texto é um comentário sobre documentos brasileiros que, elaborados na esteira da Constituição de 1988, buscaram definir os parâmetros legais e os princípios diretores do universo da educação infantil. Mas o texto não é mais um comentário sobre currículo, práticas pedagógicas, formação de professores ou qualquer outra questão específica ao universo escolar. Antes disso, se o autor analisa o modo como esses documentos definem ou representam a criança, é para desvendar nem tanto os acertos ou impasses de políticas educacionais, mas as expectativas e ilusões do mundo adulto, especialmente quando ele imagina edificar uma vida melhor representando a criança como uma sorte de vir-a-ser-democrático. Talvez por isso a particular equação entre política e educação infantil seja capaz de revelar, nesses documentos, uma ideia bastante específica de “democracia bem educada”. A análise dessa ideia é a letra do comentário que se lerá. Seu espírito é uma ligeira desconfiança quanto a uma ideia de democracia certamente generosa, mas por demais comportada.

“Que a educação, no Brasil, seja pensada como um problema de política democrática, não é difícil de compreender […]. Num país atravessado por longos períodos ditatoriais, por uma cultura política autoritária e por forte desigualdade social é possível compreender que educadores e legisladores tenham imaginado o espaço escolar e a educação formal como capazes de reelaborar ou inscrever formas de sociabilidade democráticas, como se ensino e aprendizagem pudessem contribuir para gestar uma cidadania plena. Deve-se, pois, reconhecer o papel que ocupa em nossas políticas públicas e em nosso imaginário pedagógico a tradição autoritária e excludente da vida social brasileira e a necessidade de se contrapor a ela. Mas também é o caso de se perguntar – como em outro contexto perguntara Hannah Arendt ao analisar a ‘crise da educação’ nos EUA: não há excesso (Arendt diria ‘ilusão’) em representar a criança como uma espécie de ‘vir-a-ser’ democrático, como uma potência política que deve ser realizada mediante a educação formal? Ou melhor, o que revela o desejo de que um novo mundo possa ser construído mediante a educação das crianças?”

Projeto gráfico
Luísa Rabello

Setembro de 2018