Descrição
O espião está de pé, imóvel, para traçar planos, um devasso para espreitar uma mulher, homens circunspectos param para ver os progressos de uma nova construção ou uma demolição importante. Mas o poeta permanece parado diante de cada coisa que não merece a atenção do homem circunspecto, de modo que se poderia indagar se é um apaixonado ou um espião, e, após o longo tempo em que parece estar olhando esta árvore, o que ele, em realidade, vê. Ele fica diante desta árvore e trata de tapar os ouvidos aos ruídos externos e sentir novamente o que acabou de sentir quando, em meio a este jardim público, sozinha sobre sua relva, esta árvore surgiu diante dele, parecendo ainda guardar, como após um degelo, inúmeras bolinhas de neve na ponta dos galhos, tantas são as flores brancas que ostenta. Ele fica diante desta árvore, mas o que procura está, sem dúvida, além dela, pois não sente mais o que sentiu; depois, de súbito, torna a senti-lo, mas não pode aprofundá-lo, ir mais além. É natural que, numa catedral, um viajante permaneça, em admiração, em frente das ogivas de vidro cor de sangue que o artista exibiu aos milhares entre as ramificações do vitral, ou diante das seteiras que ele abriu na parede numa quantidade infinita e segundo uma maravilhosa simetria. Mas não parece natural que um poeta fique uma hora diante desta árvore a olhar o modo como o inconsciente e seguro pensamento arquitetural que se chama cerejeira-do-japão dispôs, ao chegar a primavera, os incontáveis brancos alvéolos que exalam, enquanto não murcharem, um suave perfume sob a múltipla e escura ramificação da copa da árvore.