n.14 | 2013 – Ar, água

Catarina Barros

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Descrição

Na constelação de personagens que compõem a história da leitura (de cada indivíduo, leitor, legente) acontece por vezes a formação de um parentesco, mais ou menos provável, cuja relação – como, de resto, nas famílias normais – pode não ser imediata. a ligação entre Ellida Wangel e Clarissa Dalloway, duas personagens separadas por todas as evidências, ocorreu-me como só ocorrem certos fenómenos atmosféricos: primeiro, como uma intuição (ou uma suspeita); e, logo a seguir, como uma irreversibilidade (uma ressaca). Quero com isto dizer que, chegada aqui, mais não pude voltar atrás. a evidência desta relação não resultou de um estudo prolongado mas de uma visão imberbe. Quis o pensamento consolidar a ideia, para logo a seguir desmantelá-la, questionando-a, boicotando-a, impedindo-me até de prosseguir o seu desenvolvimento. o motivo central, creio, terá sido um certo tipo de pudor, explicável apenas por carta, numa espécie de confissão: sabes, tudo isto me parece uma profanação.